
Espreitei pela janela do quarto e dei de caras com um dia envolto numa completa névoa. Pensei, ainda são mais umas três horas neste ambiente de neblina, húmido e misterioso até o nevoeiro ser dissipado pela insolação. Gosto do nevoeiro e das sensações que me transmite. Por vezes é agradável não ver um palmo à frente do nariz, não saber o que está para além da cortina de neblina que me cerca. Tudo parece difuso e obscuro. Da costa vê-se o mar. Quando o sol rompe a luminosidade é única.
Ontem à tarde a humidade foi elevada, o céu esteve limpo, com ventos fracos e houve um forte arrefecimento nocturno. Condições ideais para o dia de hoje. E eu bem dei por isso quando levei o focinho achatado a passear.
...Não se vê palmo adiante do nariz. Lá fora os barcos, como cegos, só se guiam pelo som. O mar é um misterioso fantasma que os envolve. Cerração cada vez mais mole e espessa ... Só a voz se ouve, e o lamento parece vir de mais longe e de mais fundo. Às vezes adelgaça-se um pouco na costa, e grandes rolos de fumaceira crescem do mar sobre a terra.
in Os Pescadores de RAUL BRANDÃO